“The central problem of free-enterprise capitalism in a modern democracy has always been how to balance the role of government and that of the market. While much intellectual energy has been focused on defining the appropriate activities of each, it is the interaction between the two that is a central source of fragility.”
Raghuram Rajan em “Fault Lines: How hidden fractures still threaten the world economy"
Sempre que houve hegemonia de uma nação no mundo existiu também a predominância de idéias. Quando começou a dissertar seus tratados na metade final do século XVIII, Adam Smith não deveria ter a noção do alcance e profundidade que sua obra tomaria. Primeiro a descrever de maneira coerente a estrutura e funcionamento do sistema capitalista, não poderia imaginar que, ao desenvolver sua teoria liberal moldada principalmente nas forças naturais, por ele denominada de mão invisível (os interesses individuais conduzem a uma harmonia social), estaria esboçando o modelo de pensamento econômico que viria a dominar o mundo no século XX , especialmente após o término da Guerra Fria. Com o progresso Norte Americano e a difusão de seu modo de vida no século passado, período de enorme crescimento econômico e desenvolvimento tecnológico, também se alastrou a ideologia liberal associada ao capitalismo, que teve nos Estados Unidos seu grande defensor. A adoção do sistema capitalista e a ideologia liberal tornaram- se o único caminho desenvolvimentista, então conhecido como consenso de Washington.
Em um período anterior, muitos séculos antes do nascimento do notável escocês, mais precisamente nos anos 300 a.c, iniciava- se na China o crescimento da dinastia Qin. Baseada em uma doutrina legalista desenvolvida por Shang Yang, tinha como principal premissa o fortalecimento do estado através de leis executivas rígidas e um governo burocrático centralizado na figura do primeiro imperador. Com um controle estatal extremamente forte e dependente da força do seu exército, o regime prosperou. A economia foi estimulada com a construção de canais e redes de irrigação assim como na demanda militar por armas em ferro e bronze. Tal modelo sustentado por gastos excessivos e elevada demanda por homens e tributos terminou por esgotar o povo e os recursos estatais. Com a morte de seu líder também ruiu o império dos Qin. Entretanto, o modelo de um estado forte e centralizado serviu de base para muitos outros governos, líderes e modelos econômicos futuros. No início do século XXI, observamos o crescimento de uma nova potência mundial. Com intensa presença estatal na economia, a China prosperou tornando-se a segunda maior economia do mundo. Com a crise financeira de 2008, o modelo econômico liberal e a ausência de regulação do mercado passaram a ser questionados. O modelo chinês passou a ser passível de cópia, e assim nascia o consenso de Pequim.
Dois modelos antagônicos. Duas linhas de idéias e argumentos que cruzaram os séculos e, apesar de totalmente distintos nos remetem a um questionamento comum, especialmente atual e notadamente sem consenso: qual deve ser o papel do estado na economia?
Como mostrado no gráfico abaixo, nesta carta queremos explorar o encurtamento da distancia nos tempos atuais entre o capitalismo tradicional dos EUA (estado pequeno, alta liberdade, baixa regulação) e a social democracia da Europa (estado moderado, alta liberdade, moderada regulação), assim como o alargamento da distancia entre estes dois e o capitalismo de estado da China (estado grande, baixa liberdade, alta regulação). Analisamos também o Brasil dentro deste contexto, suas muitas andanças pela social democracia e poucas pelo capitalismo tradicional, e seu atual e perigoso flerte com o capitalismo de estado.
Estados Unidos
“… global capitalism will be replaced by nothing other than global capitalism. The traumatic events of 2007-2009 will neither destroy nor diminish the fundamental human urges that have always powered the capitalism system ambition, initiative, individualism, the competitive spirit. These natural human qualities will instead be redirected and reenergized to create a new version of capitalism that will ultimately be even more successful and productive than the system it replaced.” Anatole Kaletsky em “Capitism 4.0 The birth of a new economy in the aftermath of crisis”
Com o evento da crise hipotecária de 2008, a crença de que o livre mercado é auto regulável e que a principal função governamental seria fazer cumprir os contratos e defender a propriedade privada foi abalada. Atingida em suas mais profundas estruturas a economia americana sofre até hoje. O sistema financeiro e a indústria tiveram problemas sérios. A intervenção e o socorro estatal demonstraram-se necessários e providenciais. Sem a interferência governamental a sociedade provavelmente testemunharia a ruptura das bases econômicas globais. Muitos evocaram John Maynard Keynes.
Nascido na alta aristocracia inglesa em 1883, Keynes é frequentemente mal interpretado, tendo suas ideias associadas ao socialismo marxista o qual considerava mera falácia lógica: “Não acredito que haja qualquer progresso econômico para o qual a revolução seja um instrumento necessário. Por outro lado, só temos a perder com métodos de mudança violentos. Nas condições industriais do Ocidente, a tática da revolução vermelha mergulharia toda a população num mar de pobreza e de morte.” Tal trecho, retirado da página 130 de sua publicação Laissez-Faire and Communism de 1926, vêm a confirmar a repulsa do autor a qualquer ideia com apelo socialista revolucionário. Ao contrário, em sua Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, Keynes busca, no contexto catastrófico de 1929, entender o que havia acontecido com o capitalismo de modo a tentar preservar o próprio sistema.
Encontramos então, na referência a Keynes, uma fonte de apoio ao efeito multiplicador dos gastos do governo e intervenção estatal para o estímulo econômico em épocas de crise.
No auge da crise de 2008, sob o comando de Ben Bernanke, os Estados Unidos intervieram de maneira forte e contundente na economia. Reduziram a taxa básica de juros para níveis próximos de zero, adquiriram os temidos títulos podres e um pouco mais a frente aprovaram no congresso uma nova regulação para o seu sistema financeiro renovando o papel do estado Norte Americano. Muitos bradaram ser estas interferências um absurdo, um atentado ao liberalismo econômico. Outros tantos julgaram ser o fim da era capitalista. Porém a justiça e objetividade da análise reside em fugir de radicalismos ideológicos.
Ao dividir a atuação do Federal Reserve na contenção da crise em dois períodos podemos visualizar melhor a importância de suas medidas. Poste-se então a quebra do banco de investimentos Lehman Brothers como o marco zero das atividades estatais americanas na economia. Antes da falência da renomada instituição financeira, discutia-se internamente um conjunto de soluções de menor intervenção governamental. Leilões fechados de títulos sem valor, fusões entre instituições financeiras, entre um conjunto de outras medidas incapazes de diminuir o pânico dos mercados. A quebra da Lehman Brothers foi o sinal de que o governo americano deixaria aos mercados a solução de seus próprios problemas. A reação foi proporcional ao temor de uma quebradeira generalizada em todos os setores da economia. Foi a chave para se dar o início a um conjunto de medidas a fim de tentar salvar a economia global, verificando ser indispensável o apoio e condução do estado em crises destas proporções.
Ben Bernanke era o homem certo para o momento. Havia passado grande parte da sua vida estudando a grande crise de 1929 e seus efeitos. Havia sido coautor de um estudo chamado “Monetary Policy Alternatives at the Zero Bound: An Empirical Investigation” ou algo como “Alternativas de Políticas Monetária no Limite Zero: Uma Investigação Empírica”. Era a tentativa de construção de um manual de instruções para o Banco Central Americano -FED em momentos de estresse pleno. Chegava o momento de colocá-lo em prática. Inundando a economia de incentivos, o FED tentava dar fim a recessão. O ano de 2009 foi um breve alento. A economia dava sinais de recuperação e os mercados acompanhavam. Entretanto, em 2010 o temor de uma recessão dupla retornou. O risco de deflação nos Estados Unidos somado ao temor de insustentabilidade fiscal europeia e desaceleração chinesa trouxe a volatilidade de volta aos mercados. O FED continua agindo e afirmando que usará todas as armas necessárias para tirar o país da crise. A diferença crucial entre o período de 1929 e o atual é o nível de endividamento dos países avançados. Muitos questionam a capacidade de gasto americano. O nível da taxa de juros de 10 anos dos Estados Unidos, chegando a alcançar níveis menores do que 2,5% ao ano, comprovam que o FED até agora pode continuar imprimindo dinheiro que haverá demanda pelos seus títulos. O mercado precisa de “safe heavens” e os títulos americanos ainda o são. Em 1929 os gastos governamentais relacionados à segunda guerra mundial tiraram a economia da recessão encaminhando-a para um caminho de prosperidade. Em 2010 não há guerra e há dívidas. Bernanke não parece se importar. Ele sabe que nas crises o estado deve utilizar seu poder de tributar, se endividar e gastar. Mas acreditamos também que saiba que em tempos normais não se criou ainda nada tão perfeito como o capitalismo e sua capacidade de adaptação. Como diz Anatole Kaletsky em seu livro “Capitalism 4.0 The birth of a new economy in the aftermath of crisis”:
“Democratic capitalism is a system built for survival. It has adapted successfully to shocks of every kind, to upheavals in technology and economics, to political revolutions and world wars. Capitalism has been able to do this because, unlike communism or socialism or feudalism, it has an inner dynamic akin to a living thing. It can adapt and refine itself in response to the changing environment. And it will evolve into a new species of the same capitalist genus if that it takes to survive.”
Pela história e valores dos Estados Unidos, acreditamos que a consequência natural no futuro será um capitalismo em que o estado continue pequeno, ainda que com maior influência e responsabilidades maiores. O que nos preocupa é que sabemos que esta crise será longa.
A Europa
Do outro lado do atlântico, o bloco de países da zona do euro parece fazer um movimento ideológico oposto ao observado nos Estados Unidos. De essência excessivamente paternalista, com inúmeros programas de proteção a seus cidadãos e um enorme peso recaindo sobre as costas de seus governos, a Europa procura desonerar seus Estados. Extremamente endividada após anos de gastos irresponsáveis e inserida em um contexto de difícil realização de políticas macro econômicas, uma vez que temos diferentes necessidades monetárias em um mesmo bloco, não resta outra saída a zona do euro se não diminuir seus gastos. Apoiada em um único país totalmente saudável e equilibrado, a Alemanha, os europeus não encontram a mesma facilidade dos americanos para financiarem suas despesas. Em uma população acostumada a benefícios previdenciários, de saúde, habitação, entre outros, será difícil acostumar-se a uma realidade de menor crescimento e menos assistencialismo. As distorções provocadas em uma economia de estado excessivamente forte e protetora tornam-se evidentes. Os governos precisam reduzir os seus tamanhos e estimular o desenvolvimento do setor privado a fim de suprir a ausência dos recursos que não tem mais condições de investir.
Este cenário, inserido em um contexto de recessão mundial torna-se extremamente complicado. Apesar de não poderem, os governos precisam gastar, estimular a economia, gerar empregos. Do outro lado, é preciso criar condições de credibilidade fiscal, demonstrar sua austeridade e capacidade de pagamento dos compromissos, de modo a alongar suas dívidas e poder captar mais recursos. A situação é preocupante. O estado precisa ser diminuído, mas neste momento é perigoso tomar esta atitude. É preciso gerar condições de desenvolvimento do mercado privado, reduzir a regulação, gerar competitividade à sua indústria, buscar outros mercados, de modo a compensar a redução do consumo interno. A excessiva desvalorização da moeda pode ser um movimento perigoso, aumentar o poder de quem está melhor, no caso a Alemanha. A solução não é simples. Passa por diferentes governos de diferentes tamanhos. Passa principalmente por França e Alemanha. E passa essencialmente, no longo prazo, pelo caminho de redução do estado e sua influência sobre a economia. Não existem gastos impunes, a conta sempre chega.
China
Nos últimos anos, a China e seu modelo de capitalismo de estado, tem sido o principal motor econômico do mundo. É inegável o progresso. O país se tornou a segunda força econômica mundial. Entretanto, apesar do visível crescimento, o país é ainda extremamente atrasado e pobre, com baixos índices de liberdade e qualidade de vida. O vencedor do prêmio Nobel no ano de 2010 foi um chinês. O ativista Liu Xiabo foi condecorado com a honraria mundial por sua longa luta por mais liberdade e direitos humanos em sua terra natal. Preso sob a justificativa de subversão, Liu batalha há anos por inúmeras reformas na República Popular da China. Em seu manifesto, denominado de a carta 08, inspirado na carta 77 que foi redigida contra o regime comunista na antiga Tchecoslováquia, Liu clama por direitos e liberdades básicas como a separação de poderes, um sistema judiciário independente, democracia legislativa, multipartidarismo, liberdade de associação, religião e imprensa, a proteção ao meio ambiente e uma nova Constituição. O crescimento econômico ajuda a esconder perversas mazelas.
A convergência entre a China e o mundo ocidental é muito difícil de acontecer. Estes dois pólos estão cada vez mais distantes, desde as praticas de negócios, passando pela política econômica e os direitos políticos, até os interesses geopolíticos. Conflitos podem não ocorrer no curto prazo, mas os dois modelos se mostram incompatíveis de várias maneiras. O sucesso do capitalismo de estado chinês desde 1980 não pode desconsiderar a contradição existente entre a liberdade de inovar e competir características do capitalismo original e a obediência demandada por um sistema político autoritário. Este pode não ser um fator preponderante nas fases iniciais do capitalismo, mas à medida que o padrão de vida da população chinesa se aproxima dos padrões ocidentais, esta contradição entre os padrões liberais e o autoritarismo político vão ficar mais evidentes. Um maior clamor por direito de propriedade, um governo com maior representatividade, um judiciário independente, e uma cultura de negócios com regras mais flexíveis, vão ser questões que vão desafiar cada vez mais o poder e monopólio político do Partido Comunista Chinês.
O crescimento induzido pelo estado pode ser muito perigoso. A China vem investindo um alto percentual do seu PIB há muitos anos, mas existe muita ineficiência. Apesar da poupança alta, as pessoas são prejudicadas em benefício das empresas, que na sua maioria são estatais e muito ineficientes. Existem muitos bens não produtivos, como por exemplo o excesso de moradias vazias. A determinação da China de manter altos superávits de sua balança comercial em consequência de sua moeda desvalorizada já vem causando atritos com o mundo ocidental que tendem a se agravar com o passar do tempo. Se esta rivalidade se intensificar, no longo prazo o mundo desenvolvido ocidental poderá dedicar mais atenção aos países em desenvolvimento Índia, principalmente - cujas práticas políticas e econômicas estejam mais alinhadas com o padrão ocidental. Nesta linha podem se beneficiar países como Brasil, África do Sul e até Rússia, dependendo da linha e estratégia que optarem seguir.
Brasil
Para uma democracia relativamente jovem e uma economia em amadurecimento como a brasileira é natural a busca por um modelo adequado de desenvolvimento. Desde a instituição das eleições diretas no Brasil o país tem alternado diferentes ciclos de poder, que independente de preferências ideológicas têm conduzido o país e sua população para uma condição melhor. Há não mais de 20 anos, o Brasil iniciava sua caminhada rumo a estabilização econômica. Passamos por processos importantes como a abertura da economia e o controle inflacionário com o Plano Real. O ganho de credibilidade junto ao cenário internacional abriu as portas ao investimento estrangeiro produtivo, o país evoluiu fortalecendo o capital privado nacional tornando-o competitivo internacionalmente.
Apesar de manter grande parte da doutrina econômica do governo anterior, com a manutenção principalmente do câmbio flutuante e as metas de inflação, a chegada ao poder do governo atual iniciou a condução do país a um modelo de desenvolvimento diferente. Alavancado pelo rápido crescimento de uma região pobre em recursos naturais, no caso a China, o estado aumentou sua presença na economia. O forte crescimento chinês, criou na década passada um enorme boom no preço das commodities mundiais elevando o ganho sobre os principais produtos da pauta de exportação brasileira. Tal elevação do ganho nos termos de troca aliado a redução do risco macroeconômico criaram o ambiente perfeito para o desenvolvimento de um modelo estatal paternalista.
Com dinheiro em caixa o governo difundiu suas políticas econômicas e sociais. O estado, via o aumento de salários e cargos públicos ou através de políticas assistencialistas, mantém grande parte da população sob sua tutela. Na classe empresarial não é diferente. Seja através de empréstimos subsidiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento, pela participação de fundos de pensão controlados por sindicatos ou ainda por meio de controles regulatórios, o governo mantém sob o controle de sua batuta grande parte da classe produtiva deste país, em um modelo, que embora ainda distante em termos de liberdade e ou presença institucional, se aproxima cada vez mais do capitalismo de estado chinês. Trata-se de um modelo de desenvolvimento perigoso. Se no curto prazo é possível observar melhorias significativas nos índices econômicos inflacionados pela enxurrada financeira estatal na economia, para o futuro a história pode ser outra. Diferentemente da China e Tigres Asiáticos, o Brasil, além de investir pouco em infra-estrutura perdendo competitividade internacional, tem uma pauta de exportação especializada em bens primários de baixo valor agregado. Apesar de ter hoje uma gama mais diversificada de produtos, com diferentes commodities agrícolas e minerais, o país ainda é vulnerável à um choque no preço destes ativos tornando-se constantemente dependente do crescimento de outras regiões do planeta, principalmente a China. Além disso, o aumento da máquina estatal e seus gastos precisam ser cobertos. Hoje o país cresce a taxas satisfatórias, e tem um fluxo de investimentos positivo, o que permite inclusive a redução da dívida. No futuro não sabemos. A irresponsabilidade de gastos em períodos de fertilidade econômica traz consequências futuras, os exemplos são inúmeros, alguns extremamente recentes, como é o caso da Grécia e da Irlanda.
No aspecto social, o precedente estatal em que vivemos é ainda mais perigoso. Em um país com grande desigualdade de renda e enorme déficit educacional, tais políticas são pré- condicionais ao continuísmo e manutenção de poder, e, como nos mostra a história, inclusive na região latino-americana, são também características de regimes autocráticos. Não é preciso discorrer nesta carta sobre as mazelas de um comando centralizado e burocrático, menos ainda sobre as consequências da autocracia. Entretanto este governo já deu demonstrações de que parece não ligar para isso. Inebriados pela popularidade e carisma de seu líder parecem querer tornar o país refém de seus projetos. No inacreditável programa nacional dos Direitos Humanos deu claras demonstrações de que não tem qualquer apego às instituições e ou propriedade privada. A democracia e a liberdade de expressão são essenciais para troca e evolução de ideias. A alternância de poder que o país vêm experimentando nos últimos anos é essencial para a democracia. Seria importante para o Brasil continuar esta alternância nos próximos anos.
Conclusão
Como dito na introdução desta carta não existe consenso sobre qual o papel ótimo do estado na economia. O que certamente existe e procuramos nos distanciar é o radicalismo em ambos extremos ideológicos. Podemos achar durante um breve percurso histórico, por diferentes momentos em diferentes países, inúmeros exemplos. Os Estados Unidos em 1929 e novamente em 2008 foram salvos por pacotes governamentais de socorro econômico. Entretanto, o mesmo país, viveu duas décadas de enorme prosperidade econômica e baixíssima regulação durante os anos 80 e 90 do século passado, um exemplo liberal, o consenso de Washington. Em outro extremo, observamos em Cuba, União Soviética e agora, Venezuela uma história diferente. Os anos de chumbo de excessivo controle governamental foram sinônimos de atraso. Regimes burocráticos, sem liberdade econômica e para a população, extremamente corruptos e destruidores de riqueza acabaram com a dignidade destes países. Em outro caso específico, na década de 40, regimes autocráticos de controle governamental centralizado conduziram o mundo a uma guerra. Mais recentemente porém, a China tem sido anunciada como exemplo de sucesso econômico de administração governamental. Apesar de todos os problemas inerentes a um regime ditatorial, a principal economia asiática, com o seu capitalismo de estado, vêm sendo um dos principais sustentadores da economia mundial invocando em muitos a importância de um estado grande e forte, o chamado consenso de Pequim. Na nossa opinião, não existe entretanto consenso algum. Este é o ponto. O que existe são países com histórias e características econômicas e culturais diferentes, com níveis de desenvolvimento e maturidade diferentes, que exigem desta forma, medidas e principalmente intervenções de estado distintas. Uma China liberal seria hoje, provavelmente anárquica, assim como um Estados Unidos ditatorial.
Por fim, gostaria nesta carta, de trazer este debate para a esfera de nosso país. É claro que em um país de enorme desigualdade social e estrondoso déficit educacional, como é o Brasil, políticas assistencialistas somadas a discursos nacionalistas e um estado financiador grande e forte terão maior apelo emocional sobre a população. Este é um vício que temos na maioria de nossos partidos políticos. Entretanto, não se pode aceitar passivamente o discurso de que o desenvolvimento deste país depende de uma máquina estatal forte e paternalista. O mundo desenvolvido ocidental deve caminhar no longo prazo para um novo capitalismo longe dos extremos do liberalismo ortodoxo e da tradicional social democracia, onde idealmente teríamos um estado pequeno, mas com influencia e responsabilidade maiores. No Brasil, a consequencia destes ultimos vinte anos de estabilidade e regras claras nos coloca em uma posição relativamente confortável em um mundo que estará em crise ainda por um longo período. Mas para consolidar a nossa posição no futuro precisamos decidir o caminho que seguiremos. A democracia exige debate de idéias.